sexta-feira, 27 de novembro de 2009

MEDITANDO...

“O homem não nasceu para trabalhar, mas para criar”

Agostinho da Silva, filósofo e pedagogo português

TEMPO DE POESIA

CANTICO VERMELHO

Amo-te Felisberta
com a voz silenciada do meu sangue irmão
Da mais funda gruta de África
nosso hino rebenta florindo
os velhos jacarandás do teu país
Ordeiro, calo-me
Mas é nos teus olhos que enraízo
os meus versos salgados
neles afogo para sempre!
o orgulho que me ensinam
e de que só me defende
tua ingénua mão espancada de séculos
Amo-te Felis
na cândida melodia
das marimbas do teu povo
Amo-te Felis
no ritmo de mensagem cega
pura
das canções de tuas avós violadas
Amo-te Felis
com um amor marejado de lágrimas
as mesmas, querida,
que humedeciam nos mares antigos
o brumoso convés dos seus barcos negreiros

Mas só to direi simplesmente
quando à quieta luz dos dias que hão-de vir
o meu grito de guerra e de poeta
se quebrar em tua boca enfim livre
nos beijos despidos
da vergonha que me cobre.


Sebastião Alba (1940-2000)
poeta moçambicano

UM POUCO DE HISTÓRIA...

Sabia que Brito Camacho, que foi Alto Comissário em Moçambique, entre Março de 1921 a Setembro de 1923, se insurgia contra a forma como a colónia era governada?
Dizia ele, "as assucareiras de Moçambique, tirando a Buzi, são todas estrangeiras. Não é indiferente para a vida económica da provincia que ali se produza assucar em grande ou pequena quantidade, porque uma pequena produção implica uma pequena agricultura e uma pequena indústria, isto é, uma insignificante distribuição de capital sob a forma de salários, ao passo que uma grande produção implica uma soma importante de dinheiro distribuído, também sob a forma de salário, por um grande número de trabalhadores.
A Sena Sugar está produzindo entre trinta e seis e quarenta mil toneladas. Se a respectiva companhia fosse portuguesa, ficava na província ou vinha para a metrópole a maior parte do produto de venda do assucar que ela produz e exporta para a Europa, qualquer coisa calculada, grosso modo, num milhão de libras. Sucede uma coisa equivalente, guardadas as proporções, com as outras assucareiras, excepção feita da Buzi, genuinamente portuguesa, como já ficou dito.
Na provincia ainda não há o imposto de rendimento, de modo que sucede esta coisa macabra:- é o Governo inglês que cobra os impostos que as companhias inglesas, trabalhando em Moçambique, as assucareiras, na hipótese que estamos considerando, deveriam pagar à província. Durante a guerra, como já disse, o assucar branco chegou a vender-se na Europa a cento de dez libras a tonelada.
A Sena Sugar pagou ao Governo inglês, pelo regimen de limitação de lucros, muitas centenas de milhares de libras, ao passo que à província, onde o assucar é produzido, não pagou mais do que uns centavos por cada quilo exportado. Ou por falta de capital ou por falta de iniciativa, ou porque o desencantado génio da raça não constitua boa matéria prima para fazer assucar, a verdade é que as assucareiras de Moçambique são todas estrangeiras, com a excepção referida, facto lamentável, sob todos os pontos de vista, quer se considerem os interesses da província, quer se considerem os interesses da metrópole."

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

SERVIÇOS PÚBLICOS MAIS PERTO DOS CIDADÃOS

Portugal ocupa o primeiro lugar do ranking de disponibilização e sofisticação dos serviços públicos online num estudo comparativo da Comissão Europeia sobre Administração Electrónica na Europa. No indicador de Disponibilidade online dos 20 serviços básicos Portugal obtém, a par da Áustria, Reino Unido e Malta, 100% de pontuação. Na Sofisticação online, Portugal conquista, também a mais elevada pontuação, a par de Malta.

Estes resultados confirmam, assim, o crescimento sustentado de Portugal em matéria de Administração Electrónica. De facto, em 2004 Portugal apresentava-se na 16.ª posição em matéria de disponibilidade e na 14.ª no nível de sofisticação, enquanto em 2007 Portugal ocupava já o 3.º e 4.º lugares, respectivamente, na avaliação dos indicadores Disponibilidade online e Sofisticação online. Este ano assume a liderança nos dois indicadores tradicionais de comparação.

O estudo, divulgado na Suécia, é elaborado para a Comissão Europeia por consultores independentes desde 2001, e examina a disponibilização de 20 serviços públicos básicos - 12 para cidadãos e 8 para empresas - em mais de 14 000 sites em toda a União Europeia, Noruega, Islândia, Suíça e Croácia.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

MEDITANDO...

“Para que o mal triunfe, basta que os bons fiquem de braços cruzados”

Edmund Burke, escritor irlandês

A CORRUPÇÃO E A LUSOFONIA

"A Transparency International revelou hoje o seu ‘ranking' anual sobre a percepção da corrupção e Portugal ocupa o 35º lugar entre os 180 países analisados.

Em primeiro lugar, e com o estatuto de país menos corrupto do mundo, está a Nova Zelândia. No extremo oposto aparece a Somália.

A nova posição de Portugal representa uma queda de três lugares em relação ao ano anterior, quando ocupava o 32º lugar.

Desta vez, não há qualquer referência específica para o que terá estado na origem desta queda. O ano passado, a organização internacional explicava a descida do 28º para o 32º lugar com a "atenção pública" dada a "investigações proeminentes do desporto", como o processo Apito Dourado, e com a investigação da doação ilícita da Somague ao PSD".
in Diário Económico, de hoje

A propósito, Moçambique ocupa a 130º posição. Angola ocupa a 162º, juntamente com a Guiné Bissau, Timor Leste o 146º lugar, São Tomé e Príncipe o 111º, Brasil o 75º lugar e Cabo Verde o 46º.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

TEMPO DE POESIA

GATO

Que fazes por aqui, ó gato?
Que ambiguidade vens explorar?
Senhor de ti, avanças, cauto,
meio agastado e sempre a disfarçar
o que afinal não tens e eu te empresto,
ó gato, pesadelo lento e lesto,
fofo no pelo, frio no olhar!

De que obscura força és a morada?
Qual o crime de que foste testemunha?
Que Deus te deu a repentina unha
que rubrica esta mão, aquela cara?

Gato, cúmplice de um medo
ainda sem palavras, sem enredos,
que somos nós, teus donos ou teus servos?


Alexandre O'Neill (1924-1986)
poeta português

O DIREITO À VELHICE

Moçambique e Portugal fazem parte da Organização das Nações Unidas, vulgamente denominada por ONU. Acontece que a 16 de Dezembro de 1991, pela Resolução nº 46/91 a Assembleia Geral da ONU aprovou a seguinte deliberação denominada DIREITOS DOS IDOSOS, que importa sempre lembrar:

INDEPENDÊNCIA
1. ter acesso à alimentação, à àgua, à habitação, ao vestuário, à saúde, a apoio familiar e comunitário.
2. ter oportunidade de trabalhar ou ter acesso a outras formas de geração de rendimentos.
3. poder determinar em que momento se deve afastar do mercado de trabalho.
4. ter acesso à educação permanente e a programas de qualificação e requalificação profissional.
5. poder viver em ambientes seguros, adaptáveis à sua preferência pessoal, que sejam passíveis de mudanças.
6. poder viver em sua casa pelo tempo que fôr viável.
PARTICIPAÇÃO
7. permanecer integrado na sociedade, participar activamente na formulação e implementação de políticas que afectam directamente o seu bem-estar e transmitir aos mais jovens conhecimentos e habilidades.
8. aproveitar as oportunidades para prestar serviços à comunidade, trabalhando como voluntário, de acordo com os seus interesses e capacidades.
9. poder formar movimentos ou associações de idosos.
ASSISTÊNCIA
10. beneficiar da assistência e protecção da família e da comunidade, de acordo com os seus valores culturais.
11. ter acesso à assistência médica para manter ou adquirir o bem-estar físico, mental e emocional, prevenindo a incidência de doenças.
12. ter acesso a meios apropriados de atenção institucional que lhe proporcionem protecção, reabilitação, estimulação mental e desenvolvimento social, num ambiente humano e seguro.
13. ter acesso a serviços sociais e jurídicos que lhe assegurem melhores níveis de autonomia, protecção e assistência.
14. desfrutar dos direitos e liberdades fundamentais, quando residente em instituições que lhe proporcionem os cuidados necessários, respeitando-o na sua dignidade, crença e intimidade. Deve desfrutar ainda do direito de tomar decisões quanto à assistência prestada pela instituição e à qualidade da sua vida.
AUTO-REALIZAÇÃO
15. aproveitar as oportunidades para o total desenvolvimento das suas potencialidades.
16. ter acesso aos recursos educacionais, culturais, espirituais e de lazer da sociedade.
DIGNIDADE
17. poder viver com dignidade e segurança, sem ser objecto de exploração e maus-tratos físicos e/ou mentais.
18. ser tratado com justiça, independentemente da idade, sexo, raça, etnia, deficiências, condições económicas ou outros factores.

Estes são os DIREITOS DOS IDOSOS consagrados pela ONU e que todos os países têm obrigação de prosseguir, adequando todos os meios ao seu dispôr para a sua concretização. Em Portugal nem sempre a família, a comunidade e as instituições correspondem ao que os idosos merecem. Em Moçambique habituei-me a verificar que os mais jovens sempre respeitaram os cocuanas e sempre os ouviram com atenção, certos de que os mais velhos são o repositório das tradições, do saber e do bom-senso que possibilitam aos mais novos progredir e fazer prosperar a sua comunidade. Os portugueses, e os europeus, têm muito a aprender, com as boas tradições africanas.

domingo, 15 de novembro de 2009

TEMPO DE POESIA

SURGE ET AMBULA

Dormes! e o mundo marcha, ó patria do mistério.
Dormes! e o mundo rola, o mundo vai seguindo...
O Progresso caminha ao alto de um hemisfério.
E tu dormes no outro o sono teu infindo...

A selva faz de ti sinistro eremitério.
Onde sozinha à noite, a fera anda rugindo...
Lança-te o Tempo ao rosto estranho vitupério
E tu, ao Tempo alheia, ó África, dormindo...

Desperta! Já no alto adejam negros corvos
Ansiosos de cair e de beber aos sorvos
Teu sangue ainda quente em carne de sonâmbula.

Desperta! O teu dormir já foi mais do que terreno.
Ouve a voz do Progresso, este outro Nazareno
Que a mão te estende e diz-te: - África, surge et ambula!


Rui de Noronha (1909-1943)
poeta moçambicano

MEDITANDO...

“O tempo que passa não passa depressa. O que passa depressa é o tempo que passou”

Virgílio Ferreira, escritor português

O PANGOLIM JÁ CHEGOU?

Nasci em Moçambique e vivi na Zambézia.
Já lá vão uns anitos largos; os suficientes para já ter perdido os meus pais e para me nascerem alguns cabelos brancos.
Fui uma criança normal. Apanhei matacanha, tive filária e paludismo.
Brinquei nos areais do Chinde, nas morrumbalas do Luabo e de Marromeu.
Pesquei garoupas, bagres e caranguejos.
Conheci o Zambeze como poucos.
Estas recordações marcam e as circunstâncias em que os factos foram vividos criam uma postura diferente daqueles que nunca estiveram em África.
Os anos passam. Vamos criando raízes e fortalecendo outras novas ligações.
Mas quem sentiu Moçambique como eu senti, jamais pode abandoná-lo.
Estou ligado, para sempre, a ele. Não porque tenha que ser, mas porque quero.
Daí FIGUEIRAMBIQUE. Uma mistura da Figueira, onde resido, com Moçambique onde nasci.
Estamos juntos!